Olívio Dutra fala sobre a crise financeira do Rio Grande do Sul
O ex-governador Olívio Dutra concedeu entrevista ao jornal Estado de São Paulo onde aborda a crise financeira do Estado, suas causas, as políticas adotadas para resolvê-la e a responsabilidade dos governos que ocuparam o Palácio Piratini e trataram o estado como propriedade privada.“O Brasil, que costuma ver o RS como um estado com boa qualidade de vida e economia desenvolvida, está perplexo com as dificuldades econômicas enfrentadas pela administração pública do Estado.” Nossa matéria deverá descrever essa situação e explicar como se chegou a ela, com economistas, secretários da Fazenda, empresários, trabalhadores. Também devemos colher a análise das causas, as dificuldades e soluções encontradas pelos ex-governadores e suas sugestões para resolução definitiva do problema.A entrevista foi concedida ao jornalista Elder Ogliari do jornal Estado de São Paulo, sucursal do Rio Grande do Sul.
Estadão:
Na sua opinião, quais as causas da crise financeira do Estado do Rio Grande do Sul?
Olívio Dutra:
A enorme renúncia fiscal; os favores tributários; o sucateamento da administração fazendária; pensões e aposentadorias nababescas sem sustentação em contribuições passadas ou presentes; número de inativos maior do que o de trabalhadores ativos; um capitalismo cevado pelo Estado e o Estado funcionando mal para a maioria da população.Estadão: Há culpados para isso? Alguém ou algum ato administrativo que tenha jogado o Estado em tal situação?Olívio Dutra:Há uma política responsável por isso que tem pai e mãe no campo político partidário de sustentação do atual governo que vem se auto sucedendo há anos, somente interrompido, de 1991/1994 pelo Governo Collares e, em 1999/2002 pelo governo da Frente Popular. A privataria e o descaso para com as funções sociais e primordiais do estado foram a característica das políticas implementadas por esse campo político.
Estadão:
No seu governo, o que foi feito para controlar a situação e por que não se conseguiu?
Olívio Dutra:
Desencadeamos um combate à enorme renúncia fiscal, à sonegação e aos favores tributários; Não reajustamos salários acima de R$ 7 mil; Não atrasamos e não fizemos financiamento para pagar em dia o funcionalismo. Propusemos um Programa de Incentivo ao Crescimento (PIC), sustentado por uma proposta de matriz tributária baseada no princípio de quem tem mais paga mais, quem tem menos paga menos, e o estado, não abdicando de nenhum centavo de sua receita e, sob o controle da sociedade, através do Orçamento Participativo, otimiza seus gastos desconcentra e descentraliza seus investimentos e ações.Essa proposta, por três vezes, foi derrotada na Assembléia Legislativa onde não tínhamos maioria e não barganhamos votos. Mesmo não tendo aprovado o PIC pela Assembléia fomos tomando medidas que fizeram com que a economia gaúcha de 99 a 2002 crescesse 16 vezes mais que no período de 95 a 98 e bem mais que a do Brasil. A renda per capita dos gaúchos que, no governo anterior diminuíra 4,8%, cresceu 8,4%. A renda per capita brasileira nesse período cresceu 2,7%. O PIB industrial e agropecuário do RS cresceu 16,2% e 21,6% respectivamente e o estado assumiu o 2º lugar nas exportações brasileiras.
Estadão:
Na sua avaliação, como o problema deveria ser resolvido? É possível equilibrar o caixa sem aumentar impostos? Ou sem recorrer a receitas da administração empresarial como demitir, vender ativos etc?
Olívio Dutra:
Apoiar e se empenhar pela aprovação da reforma tributária que o Presidente Lula encaminhou para o Congresso em abril de 2003; insistir no combate à renúncia fiscal acintosa, à sonegação enorme e aos favores tributários para quem não precisa; reorganizar a administração fazendária e cobrar a dívida ativa; encontrar, com os demais poderes, uma solução democrática e estrutural para o IPE; renegociar, em conjunto com os outros estados, e em outros termos, a dívida pública com a União; valorizar a produção gaúcha de forma que se agregue mais valor ao que exportamos para o mercado interno e externo; lutar por mudanças na Lei Khandir naquilo que está prejudicando o RS; estimular a pequena e média empresa, a agropecuária de pequena e médio porte e os sistemas locais de produção; estimular o amplo e democrático protagonismo cidadão para que, num processo participativo consciente e crescente, se possa realizar essas mudanças a curto e médio prazo.
Estadão:
O que o RS não fez que os outros Estados, em situação melhor, fizeram? Qual é a diferença?
Olívio Dutra:
Não vejo que outros estados tenham feito mudanças estruturais que todos precisam fazer para que a máquina pública emule o desenvolvimento e funcione bem para todos. Maquiar problemas para ser bem tratado pela aparência e não pela essência tem sido a tônica.
Isso serve para resolver problemas de governo e nós estamos diante da necessidade e responsabilidade de encaminhar soluções para o Estado brasileiro nas suas três dimensões: municipal, estadual e federal. O RS, ao longo dos anos, foi se submetendo a uma relação federada subalterna e a uma globalização submissa. O RS tem que fazer seu dever de casa, mas, isoladamente, não resolverá problemas ligados com as questões estruturais do país.
O pacto federativo no Brasil é uma farsa. Os entes federados jogando responsabilidades uns para os outros e os cidadãos sofrendo as conseqüências desse desengonço. É preciso convocar uma constituinte exclusiva para a Reforma Política, sem terceiro mandato para ninguém e realizar plebiscitos e consultas populares sobre vários temas entre eles, a privatização da Vale do Rio Doce. O país precisa de um choque de radicalidade democrática que a Constituite de 88 apenas esboçou.
Nenhum comentário:
Postar um comentário